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NOTA DE ESCLARECIMENTO - “LISTA CURTA” DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

NOTA DE ESCLARECIMENTO

“LISTA CURTA” DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

 

A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E DAS PROCURADORAS DO TRABALHO – ANPT vem esclarecer que, no início deste mês, foram divulgados os casos que seriam debatidos pelo Comitê de Aplicação das Normas, durante a 109ª Conferência Internacional do Trabalho.

 

Apenas a ausência do Brasil na denominada “lista curta” da Organização Internacional do Trabalho – OIT, após dois anos seguidos de inclusão, lamentavelmente não constitui, contudo, motivo para celebração.

 

Com efeito, o controle de aplicação das normas internacionais do trabalho pode ser exercido por meio de procedimento contencioso ou provocado, instaurado a partir de reclamações ou queixas perante a Repartição Internacional do Trabalho, encaminhadas à análise do Conselho de Administração (I), de procedimento ordinário e permanente, promovido pela Comissão de Peritos na Aplicação de Convenções e Recomendações e pelo Comitê de Aplicação das Normas na Conferência Internacional do Trabalho (II) e, ainda, de procedimento especial, realizado pelo Comitê de Liberdade Sindical (III).

 

O Brasil vinha sendo submetido a controle ordinário pela Comissão de Peritos, que, criada em 1926, é composta de 20 (vinte) personalidades independentes, de distintas nacionalidades e notória expertise em questões relacionadas ao mundo do trabalho, eleitas pelo Conselho de Administração, após indicação pelo Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, para mandato de 3 (três) anos, permitida a recondução.

 

Renomados juristas brasileiros contribuíram e contribuem decisivamente para a Comissão, como Arnaldo Süssekind, Cássio de Mesquita Barros Junior e Lélio Bentes Corrêa, Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, que atualmente a integra.

 

Trata-se de um órgão técnico-jurídico, responsável pelo exame de comunicações e relatórios enviados pelos Estados-Membros, de forma regular e periódica, a respeito da observância das convenções ratificadas e da adoção de medidas previstas nas recomendações, garantindo-se, assim, o pleno cumprimento das normas internacionais do trabalho e a harmonia entre elas e as legislações nacionais.

           

A Comissão reúne-se anualmente e, a partir da análise de casos, elabora relatório com observações gerais e conclusões acerca da conduta dos Estados-Membros. O resultado das atividades é encaminhado ao Comitê de Aplicação das Normas, órgão técnico-político e permanente da Conferência, composto por representantes dos governos, trabalhadores e empregadores, com a finalidade de selecionar, a partir de negociação tripartite, os casos que serão debatidos em Sessão Plenária.

 

Relativamente ao Brasil, a Comissão de Peritos, em 2017, analisou a aplicação da Convenção nº 98, em virtude da introdução no ordenamento jurídico pátrio da possibilidade de prevalência do negociado sobre o legislado, ou seja, de fixação, em normas coletivas, de condições de trabalho menos favoráveis do que as previstas em lei.

 

No relatório então elaborado, a Comissão registrou “que o objetivo geral das Convenções n. 98, 151 e 154 é de promover a negociação coletiva sob a perspectiva de tratativas de condições de trabalho mais favoráveis do que as fixadas em lei” e enfatizou “que a definição de negociação coletiva como um processo que pretende melhorar a proteção dos trabalhadores garantida em lei foi reconhecida nos trabalhos preparatórios para a Convenção n. 154″, acrescentando que “do ponto de vista prático”, “a introdução de medida para permitir a redução do piso legal por meio de negociação coletiva possui o efeito de afastar o exercício da negociação coletiva e pode enfraquecer a sua legitimidade no longo prazo”, bem como que medidas de tal natureza “seriam contrárias ao objetivo de promover negociação coletiva livre e voluntária, nos termos da Convenção”.

 

No mesmo ano, o Ministério Público do Trabalho formulou consulta técnica sobre a compatibilidade entre a Convenção nº 98 e o permissivo de redução da proteção legal por meio de negociação coletiva. Em resposta, o Departamento de Normas ressaltou o posicionamento da Comissão de Peritos.

 

Diante da possibilidade de o Brasil ser incluído na lista de casos a serem discutidos durante a Conferência Internacional do Trabalho de 2017, alguns parlamentares foram à Genebra apresentar a visão do governo brasileiro sobre a reforma, o que resultou na não inclusão do país no rol dos Estados-Membros examinados. O fato foi divulgado como uma aquiescência à reforma trabalhista e a OIT se viu obrigada a emitir uma nota desmentindo a suposta anuência. 

 

Em 2018, a Comissão de Peritos fez novos comentários sobre o Brasil e a Convenção nº 98, solicitando ao Poder Executivo que reavaliasse, mediante consulta prévia aos atores sociais, a alteração dos arts. 442-B, 611-A e 611-B da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. O Comitê de Aplicação das Normas incluiu o país na lista de casos discutidos na Conferência Internacional do Trabalho. Ao término dos debates, recomendou-se ao Brasil que encaminhasse mais informações sobre a reforma trabalhista e o diálogo tripartite correlato.

 

Em 2019, a situação se repetiu, com observações também sobre a garantia de negociação coletiva para trabalhadores autônomos e o art. 620 da CLT, que prevê a prevalência das condições estabelecidas em acordo coletivo sobre as estipuladas em convenção. O Brasil novamente constou da lista de debates do Comitê de Aplicação das Normas, que propôs ao Poder Executivo que avaliasse, em conjunto com trabalhadores e empregadores, o impacto da reforma trabalhista e a necessidade de alteração legislativa.

 

Em 2020, ano em que não houve a Conferência Internacional do Trabalho em razão da pandemia da Covid-19, a Comissão de Peritos voltou a discorrer a respeito da prevalência do negociado sobre o legislado e, consequentemente, da observância da Convenção nº 98 pelo Brasil, tendo insistido na necessidade de se alcançar um acordo tripartite para a reforma dos arts. 611-A e 611-B da CLT, com expressa indicação dos direitos que poderiam ser excepcionados ou flexibilizados por meio de cláusulas coletivas. Recomendou, ademais, que, a partir de consulta prévia aos atores sociais, houvesse a adequação do art. 444 da CLT e apresentou comentários sobre os arts. 442-B, 620 e 623 da CLT.

 

Em 2021, a Comissão de Peritos reiterou os comentários sobre a reforma trabalhista e fez observações sobre as MPs nºs 927 e 936, esta convertida na Lei nº 14.020/2020, destacando a necessidade de se reforçar o diálogo com representantes de trabalhadores e empregadores para a avaliação dos impactos. Em virtude das tratativas entre governo, empregadores e trabalhadores, o Brasil não entrou na lista para debate no Comitê de Aplicação das Normas.

 

A ausência do Brasil na “lista curta” não significa, todavia, que as modificações legislativas introduzidas pela reforma trabalhista estão adequadas aos parâmetros e diretrizes das normas internacionais do trabalho. Os diversos comentários da Comissão de Peritos e do Comitê de Aplicação das Normas revelam, na verdade, o oposto e evidenciam inércia quanto às providências cuja adoção, a respeito, foram solicitadas.

 

A atuação do Ministério Público do Trabalho, pautada pelos princípios informadores do arcabouço normativo trabalhista, visa ao enriquecimento da discussão, conferindo-lhe pluralidade e autenticidade.

 

A identificação, por critérios estritamente técnico-jurídicos, de incompatibilidades entre as normas internacionais incorporadas ao ordenamento jurídico pátrio e as modificações nele implementadas não possui qualquer viés ideológico-partidário, sendo certo que o histórico das avaliações a que o Brasil vem sendo submetido, desde 2017, constitui contundente demonstração de que a OIT jamais validou a reforma trabalhista e todos os prejuízos que notoriamente causou às trabalhadoras e aos trabalhadores brasileiros.

 

A Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho está convicta de que a prevalência irrestrita do negociado sobre o legislado viola a Convenção nº 98, bem como de que seus associados e associadas têm se mantido fieis à missão institucional de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

 

Brasília, 29 de junho de 2021.

                                                              

JOSÉ ANTONIO VIEIRA DE FREITAS FILHO/LYDIANE MACHADO E SILVA

Presidente/Vice-Presidenta

ANPT

 

RENAN BERNARDI KALIL

Procurador do Trabalho

Associado desde 2012

 

 

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